sábado, 27 de abril de 2013

CIDADE PARTIDA

“O tema do livro é a divisão da cidade, de um lado o Rio que todos conhecem, bonito, turístico, alegre, ocupado por uma população afável e de classe média e, agora, sede das Olimpíadas. Do outro, a cidade escondida, onde os moradores são quase sempre pobres e os serviços públicos estão ausentes.” Durante nove meses, Zuenir Ventura, autor de “1968: O Ano Que Não Terminou”, “Viva a Favela”, “Chico Mendes: Crime e Castigo”, “Mal Secreto” (*esse é um porre), entre outros, frequentou a favela de Vigário Geral (tristemente famosa pela chacina de 21 pessoas em agosto de 1993), convivendo com o outro lado da cidade, onde a vida não vale nada e a violência é a linguagem do cotidiano, como muitas outras favelas e baixadas espalhadas pelo país, mas que os Poderes Públicos viram as costas, principalmente agora, como a preocupação primordial de maquiar a pobreza para a Copa de 2014 e a Olimpíada de 2016. Ao mesmo tempo, Zuenir acompanhava ativamente a mobilização da sociedade civil contra a violência, que resultou no movimento “Viva Rio”.
Zuenir, ele mesmo soldado engajado nesta luta, relembra primeiro, no livro “Cidade Partida”, aquele Rio supostamente idílico dos tempos da Bossa Nova, localizando naqueles "anos dourados" as sementes da violência. O livro é um impressionante relato, muitas vezes emocionado e emocionante, deste correspondente de uma guerra de lances surpreendentes e heróis inusitados, cuja solução não consiste meramente em destruir um suposto inimigo, mas em incorporar a massa de excluídos à sociedade. O autor retrata um mundo que as câmeras de TV mostram medrosamente, isso quando mostra. E é espantoso tomar conhecimento dos valores e hierarquias que imperam o mundo onde se anda sempre de metralhadora a tiracolo e a cocaína é vendida em praça pública.
E juntamente com Caio Ferraz e o sociólogo Betinho, Zuenir, com faro de jornalista, texto leve e agradável, traça o retrato de Vigário Geral e vislumbra, através do “Viva Rio” a "unificação" do Rio de Janeiro, isto é, o rompimento das barreiras das desigualdades sociais. "Para controlar a violência nas favelas não adianta chamar a polícia; é melhor chamar o Fantástico”.
Mas discutir a situação do Rio de Janeiro está na moda. Nos últimos meses todos os grandes jornais do país cederam espaço para reportagens e editoriais que tentam, quase sempre sem sucesso, analisar o problema vivido pelo Rio. Em “Cidade Partida" o cenário é uma verdadeira guerra: a da sociedade contra os bandidos, onde Zuenir certamente furou a concorrência. Esse livro, publicado pela Companhia das Letras, saiu meses antes de uma intervenção militar.
O tema do livro é a divisão da cidade, de um lado o Rio que todos conhecem, bonito, turístico, alegre, ocupado por uma população afável e de classe média e, agora, sede das Olimpíadas. Do outro, a cidade escondida, onde os moradores são quase sempre pobres e os serviços públicos estão ausentes. A tese do autor é que incluídos e excluídos, ricos e pobres, dividem a mesma cidade, mas é como se fossem duas cidades distintas.Assim como a cidade que Zuenir descreve, seu livro também é partido em dois. Na primeira parte ele apresenta alguns flashs da história carioca, principalmente para mostrar que os problemas que o Rio de Janeiro sofre atualmente não nasceram na última década, mas sim foram crescendo na medida em que as duas cidades penetravam. Em suma, a causa maior dos problemas é a exclusão centenária sofrida pela maior parte da população.
P.S. No filme “Era Uma Vez” de Breno SilveriaCLIQUE AQUI e leia a minha resenha – os personagens e Nina, interpretados pelo excelente Thiago Martins e pela bonitinha Vitória Frate, citam durante o filme uma obra fundamental para a melhor compreensão da crise institucional provocada pelas desigualdades sociais da cidade do Rio de Janeiro: “Cidade Partida”, de Zuenir Ventura, livro-reportagem no qual o autor retrata uma geração socialmente excluída. Aqueles que leram a obra de Zuenir certamente compreenderão melhor o final de “Era Uma Vez”. (“CIDADE PARTIDA” de Zuenir Ventura, 277 págs. Companhia das Letras- 2000)

Nenhum comentário:

Postar um comentário