Terça, 09 de julho de 2013, 09h40
FÉ E DEVOÇÃO
Cavalgada enriquece a centenária Festa de São Pedro de Joselândia
Por quatro
dias, o povo devoto não mede esforços para garantir uma grande festança
em homenagem ao santo padroeiro da comunidade, localizada em meio ao
Pantanal Mato-grossense, onde em época de cheia só se chega de barco
MARCIA RAQUEL/Assessoria da 1ª Secretaria
Mario Friedlander/ALMT |
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11ª Cavalgada de Barão de Melgaço |
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Ao longe o que se vê são pequenos pontos em meio à poeira fina da
estrada, seca há poucos dias. À medida que se aproximam, com suas
bandeiras coloridas e camisetas amarelas, vão despertando a euforia dos
devotos que aguardam ansiosos, em frente à igrejinha, a chegada dos
cavaleiros de São Pedro. Assim tem sido há 11 anos, desde que a
Cavalgada de Barão de Melgaço foi inserida na programação da centenária
festa de São Pedro de Joselândia. Por quatro dias, o povo devoto não
mede esforços para garantir uma grande festança em homenagem ao santo
padroeiro da comunidade, localizada em meio ao Pantanal Mato-grossense,
onde em época de cheia só se chega de barco.
Localizado a 180 km
da capital mato-grossense, São Pedro de Joselândia é um distrito do
município de Barão de Melgaço. Lá vivem cerca de 2,5 mil habitantes,
sendo a maioria pantaneiros de nascença. O linguajar típico e os hábitos
característicos não deixam dúvidas a respeito da naturalidade do povo.
Por lá, quase todos, desde os mais novos, dominam a arte de cavalgar em
meio a um dos mais exuberantes ecossistemas brasileiro.
Montados
em seus cavalos pantaneiros, conhecidos pela resistência às condições
adversas do Pantanal, mais de 50 cavaleiros e amazonas, adultos e
crianças, partiram de Barão de Melgaço e percorreram em dois dias
aproximadamente 100 km até chegar a São Pedro, passando pelas
comunidades de Estirão Cumprido, Porto Brandão, Conchas, Capoeirinha e
Fazenda Velha. Em cada localidade os fogos de artifício anunciavam a
chegada dos participantes. Assim foi até a grande recepção, quando uma
segunda comitiva de cavaleiros foi ao encontro dos que chegavam,
trocaram as bandeiras dos santos padroeiros e promesseiros e, juntos,
concluíram o último trecho da cavalgada rendendo graças aos santos em
frente à Igreja de São Pedro de Joselândia.
“Essa cavalgada
resgata a cultura da nossa gente, o cavalo é muito importante porque é o
meio de transporte mais eficaz, quase todos nós temos. Com ele você
sabe que a gente sempre vai chegar onde quer”, afirmou seo José Antônio,
agente de segurança e um dos responsáveis pela recepção da comitiva de
cavaleiros e organizador da cavalgada de São Pedro de Joselândia, que em
setembro faz o retorno a Barão de Melgaço rendendo graças à Nossa
Senhora das Dores, padroeira do município.
Valorização da
cultura - Com a proposta de valorizar as mais diversas manifestações
culturais do estado de Mato Grosso, a Assembleia Legislativa tem sido
parceira na divulgação e cobertura de eventos que retratam a cultura de
uma determinada comunidade, município ou região. A mesma atenção vem
sendo dada ao turismo no Estado, que na maioria das vezes está associado
a tais manifestações culturais. “Se nós não valorizarmos o que é nosso,
como iremos cobrar que façam isso lá fora. A cultura e o turismo
mato-grossense são atrações que encantam qualquer visitante” argumenta o
primeiro secretário da Assembleia, deputado Mauro Savi.
Mario Friedlander/ALMT |
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!!º Cavalgada de Barão de Melgaço |
Exemplo desse apoio é a cobertura realizada pela TV Assembleia à
11ª Cavalgada de Barão de Melgaço e à centenária Festa de São Pedro de
Joselândia – distrito de Barão de Melgaço. A equipe de imprensa da
Assembleia acompanhou todo o trajeto e, além de fazer a cobertura
factual do evento, produzirá um vídeo documentário para eternizar uma
das festas religiosas mais antigas do Estado que sobrevive graças à fé e
devoção do povo pantaneiro.
É bem verdade que muita coisa mudou
e, talvez por isso, a Festa de São Pedro para muitos não tenha mais o
mesmo encanto de antigamente, na época dos lampiões e banhos de poços,
que nem vai tão longe, tendo em vista que a energia chegou em Joselândia
há mais ou menos oito anos.
Mas com a chegada da energia muita
coisa mudou. O Cururu já não embala mais o levantamento do mastro,
ritual quase que sagrado nas mais tradicionais festas religiosas
mato-grossenses. Porém, o Siriri continua firme, com seu vigor e
encanto, animando os bailes pantaneiros e fazendo a alegria dos
participantes.
Seo Joaquim Barbosa aos 98 anos é uma das pessoas
mais respeitadas da comunidade. Capelão por mais de 40 anos, possui
lucidez e memória de causar inveja aos mais novos. Na falta de um padre,
é o capelão quem conduz as rezas na comunidade. Devido a idade, passou o
ofício à filha há oito anos, porém, não perde uma festança e, como
profundo conhecedor da história de São Pedro de Joselândia, não hesita
em fazer suas críticas inclusive, ao novo padre que congrega no
município.
“Eu tô achando que não vai muito tempo, porque agora
mudou, tá mudando. Porque diz que o padre veio aqui e mudou muita coisa e
a comunidade não está de acordo. Então aqui o altar era todo
forradinho, tudo limpinho né, bastante gente fazia promessa, fazia
pedido, trocava de santo e deixava na igreja. E ele chegou e mudou tudo,
não quer que tenha as imagens aí, não é pra ser forrado o altar. Antes
era o padre Líbero, ele sempre vinha, nunca falhou e nunca fez essas
exigências. Ele gostava de ver a união do povo, gostava muito. Agora
esse chegou e quer mudar tudo. Por isso eu não sei se vai durar”,
observa seo Joaquim.
Mas o desenvolvimento também trouxe muitas
novidades. “Hoje tá muito diferente. Naquele tempo aqui era um lugar
central. Agora hoje tá tendo trânsito. Naquele tempo era só carro de
boi. Tudo o que precisava vinha do rio. As telhas para cobrir a igreja
foram feitas aqui mesmo. No início a igreja foi coberta de palha. Quando
não tinha igreja, a reza era na casa de cada juiz. Só sei que quando
assustou estava pronto. Desde aquela época tem todo ano. Não falha.
Naquele tempo, era Cururu. Era baile na sanfona. Aí depois já foi
mudando para a música eletrônica”, relembra ao observar que, mesmo com
as mudanças, não falta a uma festa.
Festança -
Mario Friedlander/ALMT |
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11ª Cavalgada de Barão de Melgaço |
O que não muda desde o início da tradição de São Pedro, que segundo seo
Antônio Pedroso de Amorim (82 anos), vai pra mais de cem anos, é a
devoção do povo e o empenho em realizar a festança. “Desde que me
conheço por gente tem essa festa, meu bisavô já contava”, afirma.
Durante
os quatro dias de festejos o festeiro muda para o local da festa. A
cozinha, localizada atrás da Igreja, praticamente não para, pois durante
o evento são servidas as três refeições diárias ao povo. Logo pela
manhã as cozinheiras servem o chamado quebra-torto, seguido do chá com
bolo. Enquanto isso as panelas já borbulham nos fogões caipiras
cozinhando o almoço e logo em seguida, sem deixar o fogo apagar, seguem
preparando o jantar. Pela facilidade e característica da região, a
refeição é à base de carne de gado, que é utilizada para o churrasco,
picadinho e o tradicional ‘vai e vorta’, um picado feito com pedaços
maiores de carne macia. Para se ter uma ideia do tamanho da festa, nesta
edição foram utilizadas 16 reses.
Toda comida e bebida servida
são doadas pela comunidade. “As doações para a festa dependem muito do
poder aquisitivo de cada um. A maior felicidade nossa é ver as pessoas
saírem daqui felizes, mas infelizmente não temos muita estrutura ainda
para atender todo mundo”, afirma o juiz da festa Gonçalo Benedito dos
Santos (52 anos).
“Quando chega perto da festa a gente busca a
esmola e junta para fazer a festa. Muitos dão arroz, dão açúcar, dão
bezerro, aí os bezerros nós juntamos para comprar as vacas para matar na
festa. Tudo é de graça”, afirmou ao observar que o auge da festa é
sempre na virada do dia 28 de junho para o dia 29, quando é comemorado o
dia de São Pedro.
O Cururu - O levantamento do Mastro é o ponto
alto da festa quando se fala em fé e devoção. É nessa hora que os
devotos rendem graças ao santo padroeiro e aos santos promesseiros.
Antigamente o ritual era realizado ao som do Cururu. Hoje, porém, são
poucos os cururueiros e nem sempre estão presentes nesse momento. Aos
poucos então, o Cururu foi sendo substituído pelos hinos dos santos,
tocados pela ‘bandinha’.
“Eu acho que tem que seguir o que era
antes. Mudou muito porque antes o levantamento do mastro era só no
Cururu, hoje não tem mais, hoje é só no hino. Os mais velhos vão
acabando e os mais novos não seguem”, lamenta seo Gonçalo.
A
mesma percepção tem seo José Leôncio Peixoto de Moura, o Zé Melado (62
anos), zelador da Igreja. Ele nasceu em Cuiabá, mas vive no Pantanal
desde muito pequeno. “A festa representa uma tradição de nossos avós, de
nossos pais que vêm batalhando aqui, segurando essa imagem. E a gente
continua no mesmo pensamento de não deixar acabar. É uma herança de pai
pra filho. A mudança que teve foi por causa do Cururu que tá acabando.
Hoje tem meia dúzia de cururueiros só e não aguentam cantar a noite
toda. Antes tinha 20, 30 que tocavam a noite toda. Mas a festa eu
garanto pra senhora que nunca acaba”, assegura animado.
Mario Friedlander/ALMT |
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11ª Cavalgada de Barão de Melgaço |
Mas, para além das mudanças que ao mesmo tempo em que desagradam
alguns, agradam a outros, principalmente quando se fala em tecnologia, a
cultura não é estática. Ela muda com o passar do tempo à medida que
novos valores e conceitos vão se incorporando e transformando tradições e
costumes. O que nos leva a concluir que qualquer sistema cultural está
num contínuo processo de mudança.
Fonte:
Cavalgada enriquece a centenária Festa de São Pedro de Joselândia :: Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso