segunda-feira, 21 de novembro de 2011

O Segredo: A lei da atração e a filosofia

26 02 2009
o-segredo
Atualmente, ainda mais em sociedades díspares financeiramente, como a nossa, livros de auto-ajuda, conquistas rápidas, ganhos repentinos e teorias milagrosas de aspectos intangíveis movimentam bilhões de dólares nos mercados editoriais e alcançam enormes sucessos quando chegam até os sedentos leitores que necessitam de um alento para suas vidas tão difíceis.
Não é muito diferente do que a religião oferece, quando mostra que os melhores caminhos são os que devem ser seguidos segundo seus preceitos e práticas, elaboradas por alguns líderes, seguida por milhares de pessoas, diferentes mas unificadas.
Tenha fé e alcançará não é um conceito tão novo como a autora do livro quer fazer crer, é apenas uma nova roupagem para um conceito secular.
Teorias simplistas não são derrubadas por terem em sua essência um ponto de verdade, ainda que não se justifiquem na totalidade.
Acreditar que você pode realmente te prepara e conduz para a conquista, mas o simples acreditar não te faz ir além se apenas sentido, isoladamente. Não há milagre, não há segredos.
Da mesma forma, alguém que é um permanente pessimista, desacredita de tudo e de si próprio, obviamente tentará timidamente, lutará comedidamente e quererá menos, sendo assim, fatalmente não irá tão longe.
Esses princípios básicos, óbvios e verdadeiros são a essência de uma teoria desprovida de qualquer fundamento filosófico e mais profundo, mas por “iludirem” na essência, enganam na forma e conquistam na totalidade.
O papel da filosofia é justamente o questionar ao contrário de teorias simplistas e superficiais que carecem de profundidade lógica.
Se fossem questionadas mais profundamente não teriam o mesmo sucesso e não seriam tão aceitas se perguntadas e vistas na totalidade.
Como propunha Popper, todas as idéias e conceitos devem partir do pressuposto da falseabilidade.
A filosofia é um convite a pensar sobre determinada questão e não a pensar de determinada forma. Um exercício em constante movimento, não uma verdade única, a descoberta de um segredo revelador ou o pote de ouro de práticas existenciais.
Grandes pensadores são os que aceitam o questionamento, já que através destes, formularam suas teorias. São conscientes que novos pensamentos virão e transformarão idéias, refinando, ajustando e engrandecendo cada conceito.
Analisando o livro “O Segredo” e a teoria da lei da atração, podemos observar conceitos tidos como verdadeiros e inquestionáveis. Tentam revelar uma descoberta do que é, sempre foi e jamais deixará de ser.
É considerado pela autora como o grande segredo a ser revelado para a humanidade que, por milênios, desconheceu suas práticas de uma forma geral e apenas uns, poucos, vencedores, tiveram acesso a tais conhecimentos e, por isso, se destacaram e foram vencedores.
Para a autora, tudo o que nos chega veio, antecipadamente, através de nossa mente, atraído pela imagem que formamos de determinada situação.
Tudo o que pensamos e visualizamos, mentalmente, atraímos em nossas vidas.
Para ela, poucos como Platão, Galileu, Einstein, tinham conhecimento de tal lei e por isso tornaram-se vencedores e de tal forma admirados.
Tal descoberta “tão profunda” e feita aleatoriamente no acaso, fez com que a autora tentasse firmar sua tese visualizando em nossa época outros “detentores e praticantes” de tal conhecimento. Cita então alguns pensadores, palestrantes, empresários e filósofos afirmando que o segredo para tudo o que você quiser, sem limites, é o simples pensar que acontecerá, acompanhado do visualizar, daí você atrai tudo o que deseja.
Para “O Segredo”, a lei da atração se baseia na idéia de que nossos pensamentos geram um impulso que o universo capta, atraindo assim, tudo o que nos concentramos, conscientes ou não. Dessa forma, nosso papel é nos concentrar e deixar o resto com o universo.
O simples pensar, acompanhado do visualizar, fazendo com que você viva como se já estivesse diante de tal realidade te permite conquistar todos os seus desejos, uma teoria com um forte paralelo bíblico sobre a fé.
É interessante que as bases para tais pensamentos metafísicos e um tanto quanto esotéricos, ganham notoriedade quando suas bases são vinculadas a ciências como a física e a química, em uma tentativa de embasar os conceitos do segredo, cientificamente.
Analisando, sob vários ângulos, percebemos que o livro teve sua explosão de vendas nos Estados Unidos, uma sociedade consumista e receptiva para tais argumentos.
Sua forte repercussão aconteceu em um momento em que o mundo vivia um período de forte aquecimento econômico, abundância material e ganhos financeiros inéditos. Se o livro fosse lançado hoje, em plena crise, será que ganharia os mesmos “seguidores”?
Indo um pouco mais além, o que seria a crise, a junção de vários “pensadores negativistas”, atraindo a recessão?
Ganham mais evidências os ditos que vão de acordo com o que queremos e não necessariamente com o que precisamos ouvir, sendo assim, ao vivermos em uma sociedade onde o lucro fácil e as “loterias” ilustram os sonhos de milhões, pensamentos de conquistas repentinas mexem com a imaginação de muitos.
A riqueza, buscada por muitos e conquistada por poucos, deixa de ser uma constante luta de esforços e tentativas e passa a ser um alvo que se aproxima quase que por milagre, ao visualizarmos que um dia chegará.
E ainda, é a teoria onde o ter vai muito além do ser.
Na essência, tem lógica, mas e na forma?
Apenas o pensamento, sem a movimentação para a direção certa e as atitudes necessárias, conseguiria realmente alcançar o que sonhamos?
Os defensores argumentarão que a tese não se resume ao sonhar e sim ao acreditar, que promoverá a força para lutar e a capacidade de conquistar…. mas, se é realmente isso que o livro quer passar, se é mesmo esse conceito tão óbvio e antigo, onde está “o segredo”? Ou, a revelação de “tal segredo” é apenas uma jogada de marketing sem apresentar nada de novo e tão pouco profundo?
Para que tais teorias sejam aplicadas a autora não leva em consideração o caráter histórico, social, tornando a teoria subjetiva e superficial.
Esquece também do individualismo emocional, que o que pensamos vem de acordo com o que podermos pensar, baseados em nossas formações, aceitações, posições, realizações, ensinamentos, sociedade, exemplos, leis, deveres e direitos, incentivos, interferências educacionais, hormonais, etc..
A proposta do livro me soa como uma hipnose coletiva onde todos devem pensar da mesma forma, seguir os mesmos preceitos, não questionar tais ações e por fim, receber inconscientemente o que a consciência voluntária e programada, plantou.
Outras formas de se questionar tais segredos são, se TUDO o que é, vem movido por nossas mentes e o universo reage segundo o pensamento isolado de cada um, como podemos explicar as vitórias de um sobre o outro quando dois pensam com o mesmo objetivo?, em times de futebol, quando apenas um ganha…as vitórias são determinadas pelo pensamentos, ou treinamentos?
Se dois seres, conscientes do segredo, buscam a riqueza em frentes e direções opostas onde apenas um dos dois pode ir além, como conciliar o vencedor e o perdedor? Por suas ações assertivas ou pelo simples fato de que sua fé foi maior?
Como explicar desastres coletivos, quedas de aviões, tsunamis, torres comerciais derrubadas, guerras criadas, todos os envolvidos estavam emanando a mesma e trágica vibração, simultaneamente?
E quando um suicida sobrevive ao seu ato? Quis, sem querer?
Poderíamos evitar todas as doenças, através de um permanente pensamento positivo, eternizando-nos?
Questões como o que é vencer, ser bem sucedido e conquistar, são profundas demais para sofrerem uma análise mais complexa pelo livro, sendo assim, suas essências e conceitos epistemológicos são ignorados.
“O Segredo” vai mais além quando diz que a depressão é também perfeitamente manipulável com a consciência de tais segredos, ignorando fatores químicos hormonais, disfunções neuronais, patologias mentais, etc..
A tese é ainda mais simplificada quando diz que possuímos dois tipos de sentimentos, os bons e maus.
Sabemos diferenciá-los porque um nos faz sentir bem e o outro mal.
Aspectos culturais, sociais, temporais, mais uma vez, são totalmente ignorados.
Sendo assim, posso ir além com inúmeros outros questionamentos ou refutações que demonstram a fragilidade da “lei da atração”, mas será mesmo necessário?
A conquista está realmente em nós.
Irremediavelmente nossas ações geram resultados, mas não chegam por ações tão simplistas e sim com movimentos e posicionamentos.
Capacidade de lutar, ir além, desenvolver, buscar, combinados com o aspecto social de nossa realidade, suas interações, alianças, insistências e possibilidades, políticas, formações, acertos involuntários, caminhos impensados e tantos outros fatores e realidades imponderáveis determinam o resultado muito além do simples querer.
Vale ainda, reescrever a frase de Schopenhauer, “podemos querer o que queremos?”
Em determinados momentos de nossa vida temos sucessos e fracassos, momentos de vitórias e invariavelmente crises, seja em uma relação amorosa, trabalhos, amigos, saúde, nada é estático e temos que nos preparar para todas as situações, convictos que até nas crises surgem excelentes oportunidades.
Para que tenhamos certezas mais certas, lógicas mais racionais, conscientes e assertivas devemos nos preocupar em conhecer as verdades e seus “segredos”, de mente aberta, imparcialmente, ainda que nos choque, ainda que vá contra nossos sonhos, ainda que não alimente esperanças.
Use a fórmula de Sócrates para analisar “O Segredo” e verá sua inconsistência.
Questione quaisquer verdades com perguntas imparciais e conscientes, criando sua visão específica de um mundo que não tem uma forma final, aceitando duvidar, perguntar, entender e não seguir por ser o mais simples, agradável ou fácil.
Teorias coletivas e conceitos inquestionáveis são tão passageiros quanto seus autores e suas certezas.

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