segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Tarsila do Amaral: “Queria ser a Pintora do nosso País”

Fala Fil conversou com Tarsilinha do Amaral, Sobrinha-neta da artísta Tarsila do Amaral, considerada a maior pintora Brasileira.
Abaixo a entrevista exclusiva que Tarsilinha concedeu ao Fala Fil.
Quando você efetivamente se deu conta da importância do seu nome e do trabalho desenvolvido por Tarsila do Amaral?
Eu sempre soube que Tarsila foi muito importante. Mas, mais ou menos há 12 anos pensei em escrever um livro sobre ela.
Falei sobre esta possibilidade com um amigo, o escritor Jorge Caldeira, e ele me incentivou bastante. Então, comecei a fazer uma pesquisa e sabia que tinha muitas histórias na família e muito material ainda inédito, como fotos, cartas e até algumas obras dela.
Assim como outros grandes Artistas, Tarsila teve uma vida com altos e baixos: participou de movimentos culturais, com destaque o Movimento Modernista, trabalhou como Operária, como Pintora de paredes e se envolveu em causas político-sociais. Qual a importância que Tarsila do Amaral tem para as artes no Brasil?
Realmente ela teve uma vida de Princesa até 1929. A quebra da Bolsa de Nova Iorque atingiu drasticamente os negócios do pai dela, que era um grande fazendeiro. Depois desse fato e da sua separação do escritor Oswald de Andrade, ela namorou um médico comunista, Osório César, e a partir daí ela fez uma exposição em Moscou e voltou a Paris para desfazer seu ateliê.
Nessa época, junto com o casal Delaunay e outros amigos de Paris, ela ajudou bastante na construção das Casas dos Artistas nos arredores de Paris como pintora de paredes.
Particularmente com relação a esse fato, Tarsila mostrou-se muito solidária e amiga.
Na arte brasileira, Tarsila é única. Suas obras mudaram o rumo das artes no Brasil e ela sempre dizia que queria ser a pintora do nosso país. Ela revolucionou, além da técnica, nas cores caipiras (que seus professores diziam que ela não deveria usar em suas obras), e no tema do Brasil rural e urbano.
Depois foi além, com sua tela Abaporu, e suas obras deste período que podem ser consideradas ligadas ao surrealismo, mas com uma leitura muito particular da artista.
Quantas Obras compõem o trabalho de Tarsila do Amaral?  Onde estão essas Obras ou os principais quadros de Tarsila? Quais os quadros mais valiosos?
Fizemos o catálogo Raisonné da Pintora( Raisonné é a mais definitiva e completa referência sobre a obra de um artista, contendo imagens e documentos). Foi uma catalogação geral da sua obra e neste catálogo temos mais de 2.200 obras.
É claro que alguma obra pode ter escapado, mas achamos que pelo menos 90% ou 95% foram catalogadas.
As principais obras de Tarsila estão nos principais Museus do Brasil e nas principais coleções brasileiras. Temos algumas obras em grandes Museus fora do país, como o “Abaporu” que está no Malba em Buenos Aires e “ A Família” que está no Museu Rainha Sofia em Madri.
Temos também obras em coleções fora do Brasil, mas a grande maioria está aqui.
As obras mais valiosas são as da fase conhecida como Pau Brasil, que vai de 1924 à 1928 e as da fase antropofágica, que começa com o Apaporu em 1928 e vai até 1930. Também tem as telas da fase social de 1933, principalmente “Os Operários”, que também é valiosíssima.
 Um ano antes de sua morte, durante uma entrevista, Tarsila do Amaral declarou que “São Paulo era muito provinciana nas artes e o gosto geral era pelas paisagens iguaizinhas à vida, era o reino da natureza morta”. Conhecendo profundamente o trabalho e a personalidade de Tarsila, você acredita que São Paulo era mesmo “careta” como ela descreveu ou era Tarsila que sempre esteve à frente do seu tempo?
Realmente naquela época São Paulo era careta. A poesia era parnasiana, a música erudita e a pintura acadêmica. Nada contra esse tipo de arte, mas era a realidade da época. Foi o grupo modernista que começou a mudar este panorama em São Paulo e depois foi se expandindo para todo o Brasil.
Ao pintar o Abapuru, Tarsila declarou que tinha como objetivo fazer um quadro que assustasse Oswald de Andrade, ela queria pintar uma figura monstruosa e fora do comum. Qual foi o sentimento dela ao ver que Abapuru havia se tornado o mais valioso quadro de um artista brasileiro?
Ela declarou que pintou o quadro por inspiração e realmente Oswald de Andrade ficou muito impressionado. Ele escreveu o manifesto antropofágico e fez o movimento em razão do quadro. Foi por isso que essa obra ficou tão importante já na época que foi feita. Tarsila sabia que se tratava de um quadro importante e valioso, mas acredito que ela não tinha ideia que suas obras chegariam hoje a valores tão altos.
Quais as obras de Tarsila que você mais admira? Quais as obras que ela mais admirava?
É difícil para eu dizer qual a obra eu mais admiro… Posso dizer que adoro muitas de suas obras, mas algumas são especiais, pois pertenceram à minha família, como “ O Lago” que era do meu Tio, “Paisagem com Ponte e Mamoeiro” que era do meu Pai e    “Fazenda” que era da minha Avó.
Sobre Tarsila, não saberia dizer qual sua obra preferida, ela nunca disse isso a nenhum membro da família, mas é claro que “A Negra”, “Abaporu”, “Antropofagia” e “Operários”, deviam estar entre seus trabalhos preferidos.
Você acha que Tarsila do Amaral tem o merecido reconhecimento no Brasil? E no exterior? Quais países suas obras são mais admiradas?
Acho que no Brasil ela é um dos Pintores mais reconhecidos, senão a mais reconhecida. Ela é bastante reconhecida pela crítica, pelas pessoas em geral e pelas crianças que adoram sua obra.
Fora do Brasil ela ficou muito conhecida na Argentina, em razão do Abaporu, e na Espanha, onde recentemente fizemos uma exposição com enorme sucesso.
Fizemos também uma exposição em Paris, onde ela viveu muitos anos da sua vida, e também pretendemos fazer muito em breve uma exposição nos Estados Unidos.
Tarsila fez sérias críticas ao trabalho de Portinari(“) que também é reconhecido como um dos maiores Artistas brasileiros. Talvez ela tenha feito essas críticas em razão de ter convivido em Paris com Picasso, precursor do movimento Cubista. Tarsila não gostava dos trabalhos do Portinari? Havia certa rivalidade entre eles?
Acho que isso não é verdade… Ela até escreveu dois artigos sobre Portinari nos Jornais dos Diários Associados, de seu amigo Assis Chateaubriand.
No primeiro em 1936, ela conta que foi em sua casa para ver os quadros de uma de suas primeiras exposições e ela defende o prêmio que ele tinha recebido recentemente, mas que estava sendo contestado pela crítica da época.
No outro artigo em 1944, ela também teria ido visitar a casa de Portinari no Rio de Janeiro e elogia muito suas obras, e também fala com carinho especial de seu filho, João Cândido.
Estes artigos estão publicados no livro Crônicas e Outros Escritos de Tarsila do Amaral, escrito pela professora Laura Brandini.
(“) Essa informação, o Fala Fil encontrou numa entrevista que Tarsila do Amaral concedeu à Revista Veja e ao Jornalista Léo Gilson Ribeiro, em 23 de Fevereiro de 1972.

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